São Francisco e Santa Rosa.
10 km de uma estreita estradinha de terra e chegamos lá. A porteira azul meio remendada nunca foi trancada, também, pra que? Não havia sinal de vida humana num raio de 10 km e aquele paraíso era só nosso.
Subindo uma ladeirinha já dava pra avistar o lago e o puxadinho feito por Ele para que se pudesse observar o céu nas noites estreladas do meio da água. A capelinha ficava logo ali, com direito a altar, imagens e até um sino. Sempre que a Menina chegava perto desse sino se perguntava quantas pessoas antes dela haviam puxado a corda e ouvido as badaladas.
Depois do gramado via-se a casa grande. “Grande” é apenas força de expressão, a casa era simples, antiga. Tinha as paredes brancas e as portas azuis, dando um ar de “céu” pro lugar. Em todas as portas viam-se maçanetas brancas de porcelana pintadas à mão, flores rosadas e vermelhas com um pouco de verde. O chão de madeira resmungava quando passávamos por ele, tinha até umas falhas entre as tábuas, mas que ninguém ligava, o chão pertencia à casa e ninguém poderia mexer nele.
Passando pela sala e por mais um portal azulado chegava-se a cozinha. O coração da casa. O majestoso fogão à lenha aquecia tudo no cômodo: as conversas, gargalhadas e a água pro café. O calor da lenha nos unia. Na janela, um pequeno rádio cantor de música sertaneja deixou a música gravada nas paredes e nas lembranças que agora, Ela tem da casa de quando era menina. Só agora Ela se deu conta do quanto foi feliz naquele chão de terra batida, de como era bom refugiar-se do barulho e da fumaça pelo menos aos finais de semana. Fugir pela estrada à cavalo, sem ter hora pra voltar, caminhar pelas trilhas na mata, alimentar as galinhas, os coelhos, sentir o cheiro do eucalipto, correr contra o vento, se isolar em qualquer canto, tocar o sino...Havia tanta vida naquele lugar, que o mundo lá parecia ser outro. E era.
Agora o arrependimento bate, poderia ter aproveitado mais, poderia ter evitado o fim de uma época que não volta mais, de uma época em que eram mais do que apenas os quatro. Quando as preocupações viravam grãos de areia e eram jogadas ao vento. Hoje, Ela chorou pela primeira vez a perda daquele pedaço de céu, a saudade que sente do seu paraíso particular aperta cada vez que a Menina se afasta dela com o passar dos anos. A Menina ainda deve morar lá, já que ela não se lembra de nenhum outro lugar no universo onde tenha sido mais feliz.